Corro o risco de mimar a criança?

Hoje eu gostaria de falar com você que o amor nunca é demais. Normalmente, escutamos pessoas falarem: “cuidado, senão esse menino vai ficar mimado” e “cuidado, não dá colo nem peito demais!”

Se formos pensar bem, tudo isso que nos falam para não fazermos com as crianças, está muito relacionadas ao amor. Amamentação está muito relacionada ao amor, o colo está muito relacionado ao amor e a acolhida está muito relacionada ao amor.

Mimar a criança X Dar muito amor (que nunca é demais)

Mimar uma criança é muito diferente de dar amor e, às vezes, as pessoas misturam essas duas informações, esses dois conceitos. “Mimar”, na disciplina positiva, é “fazer pela criança aquilo que ela já pode fazer sozinha, pois já é capaz”. Às vezes, você está fazendo coisas por ela que ela poderia estar fazendo sozinha, e isso não inclui colo, abraço, beijo, carinho, acolhida, o leite, enfim, então por que temos tanto medo?

Eu me pergunto isso: por que a gente tem tanto medo de dar para a criança aquilo que todos nós desejamos ter, o amor? Precisamos refletir que o amor nunca é demais. Mesmo que muitas pessoas digam “ah, o amor estraga”, não, o amor não estraga, o amor dá segurança, nos faz sentir amados, seguros, importantes, confiantes e, para chegarmos na fase da independência, precisamos, primeiro, passar pela dependência.

O apego na educação das crianças causa dependência?

Em algum momento da nossa vida, especialmente na infância, vivenciamos a dependência: vamos depender da mãe e do pai para alimentar, ganhar colo, acalmar, quase que para respirar e viver; é uma ligação muito forte.

Engana-se quem acredita que essa ligação acaba, pois ela não acaba nunca, apenas vai se transformando, passando por fases e por etapas. Hoje em dia, o que se entende na disciplina positiva em relação à criação com apego é que o apego não faz mal, pelo contrário.

Quando a criança tem uma necessidade e apresenta desconforto, fome ou dor, por exemplo, normalmente mostra por meio do choro, porque ainda não sabe organizar isso e informar verbalmente. Nós, adultos, percebemos esse desconforto, atendemos à necessidade e, quando isso ocorre, a criança entende que pode contar com a gente — assim, entende que a comunicação desses sinais funciona, e é positiva.

Por que atender aos sinais da criança?

Ela emite sinais, entendemos e respondemos a eles. E por que não? Muitas vezes, não respondemos por medo das consequências: “se eu for toda vez que ele chorar à noite, será que vai ficar mal-acostumado? Será que se eu responder quando ele pedir ajuda, vai aprender a fazer as coisas sozinho?”.

Sempre temos medo de deixar a criança mal-acostumada, mas existem muitas diferenças entre atender à necessidade da criança e deixá-la mal-acostumada.

A diferença entre atender às necessidades da criança e mimar

As necessidades das crianças são reais e, no início da vida, elas ainda não estão tão claras — se é uma necessidade fisiológica ou se é uma necessidade emocional —, então é um contexto psicológico ainda mais forte.

A criança tem uma necessidade física, e se torna uma necessidade emocional, ou tem uma necessidade emocional e se torna uma necessidade física e, se a gente não responde, muitas vezes a criança até sobrevive, fica bem, porém, insegura.

Ela entende que aquele sinal de necessidade emitido não foi bem compreendido, porque não teve uma resposta, então pensa que precisa se virar sozinha. Mas esse “se virar sozinha” é antes dela estar pronta, pois ainda precisaria de um adulto.

É muito importante entendermos esse ciclo chamado “ciclo do apego seguro” ou “ciclo do apego inseguro”. Aqui no Brasil, temos o hábito de usar “seguro” e “apego” como palavras negativas, de uma forma até pejorativa, mas a palavra “apego” em inglês, é “attachment” e, traduzida, quer dizer “vínculo”. Pense como é importante o vínculo entre mãe e filho entre pai e filho!

O vínculo com meu filho está na medida certa?

Esse vínculo nunca é demais, não existe um vínculo exagerado. Muitas vezes, nossa intuição diz que precisamos responder, não podemos deixar a criança chorando, que podemos atender às necessidades dela, mas, como eu sempre digo, sempre tem alguém para nos dizer “não faz isso, que ele vai ficar mal-acostumado”, como se esse amor demais fosse ruim.

Mas, muitos de nós já têm lá no fundo uma intuição que diz: “está tudo certo, continue respondendo, crie segurança e essa base, pois ela vai conseguir andar com as próprias pernas”.

Imagine a sensação de morar num lugar onde não tem hospital 24 horas, onde você sabe que, se passar mal, não vai ter com quem contar! Essa é a sensação da criança que tem uma necessidade, pede ajuda e, às vezes, não é respondida. Essa é a mesma sensação que nenhum de nós, adultos, gostaria de ter, então por que eles precisam ter?

Na hora certa, no tempo deles, no ritmo deles, eles estarão maduros o suficiente, seguros para seguir com mais independência, mas por um bom tempo precisarão de nós, e precisam estar ligados a nós de uma maneira intensa. Lembre-se: amor nunca é demais.

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Dra. Mariana Lacerda

Terapeuta ocupacional, Mestre em Ciências da Reabilitação e Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente pela UFMG.

Uma abordagem baseada em afeto e respeito para transformar a educação de crianças e jovens.

Aprenda como lidar com as explosões emocionais das crianças de forma respeitosa e eficaz.

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