Eu não sei vocês, mas eu fico incomodada quando vejo alguém chamando uma criança menor de 3 ou 4 anos de egoísta! Não é um julgamento da minha parte, mas sim um desejo de explicar e contar o que acontece no início da vida em termos de desenvolvimento.
Não podemos rotular e definir uma personalidade assim tão cedo.
Rótulos positivos e negativos nos transformam em papéis que não são nossos e normalmente esse rótulo ainda vem com um adendo: é egoísta porque não empresta os brinquedos, não divide o que é dele (a), não aceita que outras crianças brinquem junto. Quando não vem com o adendo de algum “transtorno” ou “diagnóstico” dado pela pessoa.
Nessas horas gosto de propor duas reflexões:
#1. O que é ser egoísta?
É a falta de altruísmo, ou seja, seria não se preocupar com os outros, não dar espaço para algo que é basicamente instintivo nos seres humanos.
Nosso altruísmo começa com a gente se reconhecendo como indivíduo. Quando nós tratamos a criança como um ser único, respeitando e ajudando-o a se reconhecer como uma pessoa única, já estamos contribuindo com esse processo.
Sendo assim, se a gente for se aprofundar no assunto, vamos ver que as crianças estão passando por um percurso de construção, não estão definidas a ser algo para sempre.
#2. Quais são as etapas do desenvolvimento do Brincar?
Trago essa reflexão porque geralmente quando nos preocupamos com o fato da criança ser egoísta, essa preocupação está ligada ao fato de vermos no exercício do brincar a criança atuando nessa forma. Para mim, no lugar de Terapeuta Ocupacional, é imprescindível entender o processo de desenvolvimento do brincar e o impacto dele na vida da criança. Ao olharmos para esse processo vamos descobrir a razão desse “egoísmo”. Vamos ver?
O brincar do nascimento aos 18 meses:
Até 3 meses: o ser humano é, para a criança pequena, o “brinquedo” mais rico em descobertas.
De 3 a 12 meses: ocorre o refinamento das habilidades motoras, assim a criança explora mais os objetos, utilizando todo o seu sistema sensório-motor para aprender e fazer novas descobertas.
De 12 a 18 meses: o desenvolvimento da locomoção estimula a descoberta do prazer do corpo em ação. A sensação de liberdade, é incrível.
De 18 a 36 meses: nessa fase, a criança é exploradora, curiosa, tem um crescente desejo de independência.
Então gente, vejam só!
Até os 3 anos de idade não tem como a criança não ser assim, querer tudo para ela, desejar todos os brinquedos, não gostar de dividir. Ela precisa que esse processo seja “egoísta” para que ela possa aprender tudo que precisa para se desenvolver.
Só após os 3 anos ela tem condições de compartilhar de fato, com consciência do outro. Por volta dos 3 anos ela passa a usar o termo “eu” e entende que está separada do outro, por isso consegue então ter empatia e fazer trocas reais.
Aos 3 anos as crianças descobrem o prazer da companhia de outra criança. Iniciam os jogos associativos e seu brincar evolui para a macrosfera. A curiosidade expande para fora de seu ambiente familiar: parque, escola, festas e reuniões familiares.
Claro que podemos e devemos incentivar as trocas, os momentos junto com outras crianças, o compartilhar desde cedo. Mas não precisamos criar uma expectativa mais alta do que o próprio processo de maturação do brincar e das habilidades sociais da criança. Não precisamos acreditar que somos adultos ruins, que não ensinamos bem, ou que as crianças são como falei no início, “egoístas”.
Podemos continuar ensinando o altruísmo, a empatia, o olhar para o outro, sempre! E podemos começar por nós mesmos, praticando tudo isso com as próprias crianças.
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Com amor,
Mari!